ENTREVISTA COM O CARNAVALESCO LUIZ FERNANDO REIS





Luiz Fernando Reis, Carnavalesco dos Eternos enredos críticos da Caprichosos de Pilares nos anos 80, assinou carnavais em diversas escolas como Barroca em São Paulo e o Salgueiro.
Nossa conversa foi no Petisco da Vila, onde ele me revelou que foi lá que surgiu a idéia do "Saudade", da Caprichosos de Pilares. Coisidências a parte, foi uma aula de carnaval, abrilhantada pela irreverência e espírito crítico genial que continuam vivos na mente deste artísta.

William Oliveira: Além da Caprichosos quais outras escolas você fez?

Luiz Fernando: Várias... fiz Barroca em 1998 com Nas ocas da Barroca o Índio viu quem invadiu..., No ano 2000 o enredo da Vai Vai era meu, fiz Salgueiro em 1989 com o Flávio Tavares, Salgueiro Templo Negro em tempo de Consciência Negra, a proposta era ousada pois logo após o ano do centenário iríamos falar do negro  e de sua luta novamente, mas uma das grandes sacadas do enredo era: O Salgueiro sempre foi uma escola que falou muito bem do negro, então vamos rever este centenário e sua atualidade... 

WO: Qual o lado positivo do carnaval de hoje pra você Luiz Fernando?

LF: A grandiosidade inegável dos desfiles, do espetáculo. É sem dúvida a maior festa popular do mundo. Temos que tomar cuidado com ela para não perdê-la...
O Negativo, é a falta de democracia, a Escola de Samba ser de um só homem, isto é muito desigual! E está se tornando cada vez mais comum. Não deve haver interferência demasiada do dirigente na criação do desfile. Não deve haver uma única palavra em nenhum setor da escola.

WO: Como deve ser um bom enredo?

LF: Não posso dar o mesmo tratamento do enredo "Cocada", para o enredo "Jorge Amado" por exemplo... O Grande lance é você criar, por isto depende do enfoque que é dado, então todo enredo é bom! Depende do tratamento!... As vezes um enredo para uma escola é bom e pra outra não é! Depende da cara da escola e de sua comunidade.
Atualmente se vê muito uma receita de enredo... ou duas receitas: Tem o enredo que você joga o nome de uma pessoa ou objeto e conta a história do carnaval e no último carro vem a pessoa ou o objeto... então fica tudo muito fácil e óbvio!
E tem também aquele clássico que começa no Egito... e parece que o jurado só dá nota 10 se isto acontecer... não há então espaço para uma inovação, não há liberdade, fica tudo muito formatado assim a um único tipo de desfile. 

"Precisa ter trabalho criativo em cima do enredo."


WO: O que tem que ter uma boa alegoria?

LF: Madeira e Ferro! ( risos ) Tem que contar a história, uma alegoria é um cenário onde os componentes interagem e contam o enredo, o que se vê hoje é uma guerra por quem faz a melhor instalação de arte... e carro alegórico é um cenário não é uma escultura, não é uma peça pra ficar exposta num museu, é algo que deve funcionar no momento! Um carnavalesco tem que entender que ele não é um artísta plástico, ele tem que contar uma história em seu desfile e passar de forma clara a mensagem.

WO: Então podemos dizer que a característica marcante do seu trabalho, seria a clareza de contar a história?

LF:   Creio que sim... com certeza sim, mas sei que o que basta fazer carnaval, não existe um certo ou errado!
Mas todos infelizmente, querem seguir um padrão pois ficam com medo de não fazerem sucesso caso fujam do óbvio!
Sei que meu estilo faz falta... Está tudo muito sério, deve ter um desfile que brinque com o público, que interaja com o público.

"Uma das maiores características dos meus trabalhos é sem dúvida contar o enredo..."


WO: O Paulo Barros... Como ele conseguiu fazer algo diferente? Ele teve sorte ou teve o Luiz Fernando como diretor de carnaval?
LF: Eu admiro muito o Paulo Barros, eu te confeço que eu aprendi muito com ele, pois ele se permite criar, ele sai da formatação, aprendi a liberdade de criar sem medo com o Paulo. No ano do carro dos espantalhos eu era o Diretor de Carnaval da Tuiuti, e o Paulo Barros o Carnavalesco, o enredo era sobre o Portinari, e uma pessoa, um dos dirigentes da escola, quando viu o carro abre alas, todo feito com latas de tinta, me chamou e disse que estava muito preocupado com aquilo não dar certo, e que as latas quem sabe, deveriam ser colocadas ao menos de uma forma mais simétrica e não todas atrapalhadas! Aí eu disse a ele, feche os olhos e imagina na avenida! Está do caralho! E assim foi, o carro saiu e fez um sucesso internacional! E Foi com esse enredo que o Paulo Barros decolou. O cara é um gênio a seu modo!
Como te disse, não deve haver interferência demasiada do dirigente, quanta coisa criativa não deixou de sair por conta de um presidente, e claro, que também muita coisa ruim deixou de sair por causa de um presidente. (  Risos )

"O Paulo Barros se preocupa muito mais com a idéia!"


WO: Qual desfile ou desfiles mais marcante (s ) que você fez?

LF: Ah, o Saudade, sem dúvida nenhuma o Saudade da Caprichosos!

"Sabia que a idéia do Saudade nasceu aqui no Petisco da Vila?!..."




WO: E qual desfile ( s ) que outros fizeram que marcaram você e que lhe são inesquesíveis ?

LF:  Kizomba,  fantástico!!! Só um?... Pode mais?...
Porque não é só este, mas os enredos do Renato Lage na Mocidade, o Renato Lage este ano de 2010 no Salgueiro, ele brincou de fazer carnaval! Estava tudo genial...
Todos da Rosa Magalhães na Imperatriz da década de 90... ela e o Renato também foram e são grandes inovadores! Cada um no seu estilo!
E claro o Campeonato do Paulo Barros na Tijuca em 2010, aquilo foi incrível!

"Eu destaco também alguns trabalhos do Oswaldo Jardim e do eterno Mestre Fernando Pinto!... "

WO: Você participou da produção da reedição do Saudade na Caprichosos em 2010?

LF: Plasticamente não. Mas no começo eu estava presente sim, depois eu falei pro presidente ( ...que estava na época ) , deixa eu ficar em casa que é melhor... ( A escola já vinha com muitos problemas, ates de ser rebaixada pra o grupo B do Rio... )

WO: Voltaria a fazer o carnaval da Caprichosos?

LF: Com certeza!

"Se olhar pelo luxo e grandesa visual o desfile do Salgueiro 1989 foi o meu melhor trabalho."



WO: No que você está trabalhando atualmente?

LF: Recentemente fiz alguns trabalhos no Carnaval de Porto Alegre.
E sou Professor de Matemática, esta é minha profissão.
Também escrevo pro site Galeria do Samba e tenho dois Blogs, um de matemática e outro de carnaval.

"Tenho algumas críticas mas é melhor deixar pra lá..."

WO: Quais qualidades são importantes para um Carnavalesco?

LF: Eu fiz uma matéria sobre isto. Ele não precisa desenhar! Ele tem que ter a visão macro do espetáculo, aí eu acho que é uma visão cultural... Eu acho que saber desenvolver um enredo é fundamental, ali está a sacada, ele tem que saber criar.

"Estou escrevendo a crítica dos Sambas Enredo deste ano, para o Galeria do Samba e destaco o Samba Enredo da Portela deste ano,o da Tijuca e o da Vila, lindos!"

Relembrando mais um pouco do desfile "E por falar em saudade... Caprichosos de Pilares 1985, pra matar a "Saudade"! :




Leia o texto que fala sobre o que é um carnavalesco do Luiz Fernando Reis  AQUI
Confira o Novo Blog do Luiz Fernando AQUI


Comentários

Developer Seer disse…
Que legal é sempre bom ouvir como foram os passos de um carnavalesco consagrado com enredos conhecidos e lembrados por todos.

É realmente necessário falar do mando dos presidentes, isso é muito complicado de lidar e triste de ver pessoas com os sonhos nas mãos sendo barradas, por sabe se lá quais razões.

Mas é muito bom ver pessoas serem bem sucedidas mesmo com essas dificuldades, parabéns Luiz Fernando.
Simone MartinS2 disse…
Gosto do Carnaval ARTE, POESIA, MAGIA...Onde todos são iguais e possuem os mesmos direitos a diversão, comoção! Por mais belo que seja os Carnavais de hoje, rola muito dinheiro, intrigas e puxações de tapete. Vejo o povo mais humilde, como os verdadeiros icones dos desfiles, vejo garra, amor entre suor, lagrimas, sangue(bolhas e calos).Um povo humilde que deixa, nas historias de belos desfiles carnavalescos, uma pequena marca, pois os poderosos é que viram celebridades. O que me emociona é ver a passista com uma meia furada, mas sorrindo, cantando, vibrando...Os olhos inchados, as maos calejadas resultado das noites mal dormidas enfurnados nas oficinas e correndo contra o tempo. Esses sim merecem meus aplausos. Escrever, montar, organizar, selecionar com dinheiro, fica facil...Dificil é reconhecer quem tem o dom e dar o verdadeiro valor...Parabens a voce, professor de matemática, que conseguiu um pouco de espaço para mostrar teu talento!

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